Epidemiologia da Depressão em Crianças e Adolescentes
O diagnóstico de transtorno depressivo maior vem aumentando de forma signigicativa entre crianças e adolescentes, de maneira que alguns pacientes apresentam o primeiro episódio durante os primeiros anos pré-escolares, antes da puberdade ou na adolescência. Percebe-se, a partir desses dados, a importância de se reconhecer os sinais e sintomas do transtorno em crianças e adolescentes e principalmente, de desenvolver um tratamento efetivo para ele.
De acordo com Dumas (2011), em relação a prevalência e características ligadas à idade e ao sexo, estima-se que 17 a 20% dos jovens terão episódios depressivos antes do final da adolescência. E isso faz da depressão uma das psicopatologias da infância e da adolescência mais frequentes.
Dumas (2011) cita um estudo epidemiológico canadense que ilustra as dificuldades encontradas com frequência nessa área. Com base em uma amostra normativa de mais de 2.800 crianças e adolescentes entre 6 e 16 anos, em que Fleming, Oxfford e Boyle relatam que a prevalência do transtorno depressivo maior (diagnosticado com a ajuda dos critérios do DSM-IV) oscila bastante em função do nível de certeza do diagnóstico apresentado. Em um nível de certeza elevado (a saber, o diagnóstico só é apresentado quando os sintomas depressivos estão claramente presentes), 0,6% de crianças e 1,8% de adolescentes são afetados. Em um nível de certeza médio (vários sintomas estão claramente presentes), os índices quadruplicam e atingem 2,7 e 7,8% respectivamente. E em um nível de certeza baixo (vários sintomas estão presentes, mas sua gravidade pode ser menor), as mesmas taxas aumentam até 17,5 e 43,9%.
Nesse estudo observou-se que o transtorno distímico é menos frequente (entre 1 a 5%). Sua prevalência difere em função da idade e do sexo.
Idade
A prevalência dos transtornos depressivos é inferior a 1% antes dos 6 anos de idade. Aumenta a partir dessa faixa etária, atingindo entre 2 e 3% das crianças com menos de 12 anos e 6 e 9% nos adolescentes. Pesquisas mostram, de fato, que a prevalência cresce perto da puberdade (é em média 3 a 4 vezes mais elevada na adolescência do que na infância).
Segundo Ribeiro et. al (2011), o primeiro episódio surge em torno dos 9 anos e costuma durar de 5 a 9 meses. Destes, 74% apresentam melhora significativa, apesar de permanecer certo grau de prejuízo psicossocial (quanto mais precoce o surgimento da psicopatologia, maior o prejuízo - em alguns casos mais severos que para os adultos).
Apesar de a maioria se recuperar após o primeiro episódio, dados clínicos sugerem a probabilidade de recorrência de 20 a 60% entre 1 e 2 anos após a remissão, chegando a 70% em 5 anos.
A partir disso, percebe-se que a depressão em crianças e adolescentes possui alto risco de recorrência que se estende até a idade adulta, o que aponta a vulnerabilidade da população infantojuvenil para o transtorno. Entretanto, apesar de existirem estudos demonstrando que o transtorno acarreta forte impacto sobre as crianças, e, mesmo sendo um problema frequente na prática clínica, ele ainda tem sido pouco diagnosticado e, por consequência, poucos pacientes recebem um tratamento eficaz (Ribeiro et. al, 2013).
Sexo
A prevalência de transtornos depressivos cresce nas meninas com a idade, de modo que as meninas correm um risco 2 a 3 vezes maior de sofrer de depressão que os meninos. Essa oscilação mantém-se na idade adulta.
Nas crianças, os dados são menos claros. Estudos indicam que até os 12 anos, os transtornos de humor (sobretudo o distímico) são mais frequentes nos meninos do que nas meninas. Provavelmente essas contradições reflitam, em parte, o fato de as amostras em que se baseiam esses dados e os métodos utilizados para avaliar a depressão nem sempre serem semelhantes. Pode ocorrer também que a idade em que os dados epidemiológicos são coletados tenha influência.
Um estudo de crianças de 9, 11 e 13 anos relata, de fato, que a puberdade estava associada a um aumento dos transtornos depressivos nas meninas, mas a sua diminuição nos meninos. Caso esses resultados se confirmem, a puberdade, mais do que a idade, poderia explicar diferenças epidemiológicas de acordo com o sexo.
A interpretação a ser dada ao crescimento da incidência de transtorno depressivo nas meninas durante a adolescência é um tema sobre o qual pesquisadores se debruçaram. Em uma revisão detalhada, Nolen-Hoeksema e Girgus citados por Dumas (2011), mostram que os dados disponíveis levam a crer que esse aumento reflete a convergência de alguns elementos- -chave. Antes de tudo, indicam que existem diferenças consideráveis na maneira como as meninas e os meninos abordam as situações estressantes: mesmo antes da adolescência, as meninas têm a tendência a prolongar essas situações, a se preocupar longamente e a se culpabilizar, enquanto os meninos procuram se distrair mediante a ação, frequentemente se absorvendo em uma atividade que mobiliza sua atenção .
Além disso, no início da adolescência, as meninas costumam enfrentar mais situações estressantes, as quais estão ligadas à puberdade e às mudanças biológicas e psicológicas que ela provoca, sobretudo no que se refere ao humor. Tudo isso reflete diversos aspectos familiares e sociais.
Por exemplo, as meninas são impelidas por pressões da sociedade, da cultura e da mídia a se amoldar a um ideal de beleza física muito diferente e muito mais difícil de alcançar do que os meninos.
Por último, na maior parte das sociedades, as mulheres e, antes delas, as adolescentes, estão expostas a condições de vida em geral mais estressantes que os homens, como pobreza, falta de instrução formal e violência física e sexual.
Esses fatores poderiam facilitar uma tendência que conduz adolescentes a apresentar sintomas depressivos acentuados ou transtorno de humor - o que explicaria, pelo menos em parte, os dados epidemiológicos encontrados na maioria dos estudos.
Dumas (2011) cita que embora pesquisas que permitam fundamentar cada uma das hipóteses sejam muitas para serem apresentadas, deve-se destacar que as meninas costumam enfrentar os desafios da adolescência de maneira diferente dos meninos. Por exemplo, dois estudos comparativos, com mais de 800 adolescentes cada um, relatam que as meninas tinham uma tendência mais acentuada à falta de consideração por si mesmas (duvidar de si mesmas e de sua aparência física, etc.), de levar em conta os elementos negativos de uma situação em detrimento de um modo de pensar positivo ou de expressar uma necessidade mais pronunciada de se sentir aceitas e de ter êxito do que os meninos. Já eles eram mais impulsivos e se diziam mais prontamente dispostos a resolver os problemas interpessoais pela força.
Ainda que esses efeitos sejam modestos e as exceções abundantes, eles se manifestam em uma escala muito grande e poderiam assim explicar, pelo menos em parte, a frequência preponderante de fenômenos depressivos nas meninas durante a adolescência, enquanto os fenômenos agressivos são mais frequentes nos meninos.
Em geral, na adolescência, a sintomatologia depressiva de nível clínico varia entre 10 e 40% e é mais elevada nas meninas do que nos meninos, sobretudo quando os dados provêm dos próprios adolescentes, e não de seus pais ou de seus professores. Esses resultados indicam que os fenômenos depressivos são frequentes nos adolescentes e que representam, então, na maioria dos casos, bem mais do que sinais de inquietação interior, ainda que um grande número deles não sofra necessariamente de um transtorno de humor.
Referências:
Dumas, J. E. (2011).Psicopatologia da infância e da adolescência. Porto Alegre. Artimed.
Ribeiro, M. V. Macuglia, G. C. R. & Dutra, M. M. (2015). Terapia cognitivo comportamental na depressão infantil: uma proposta de intervenção. 2013, 81-92. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-56872013000200003



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